domingo, 30 de novembro de 2008

Legislação Federal sobre “Poluição Visual” Urbana

Legislação Federal Sobre “Poluição Visual” Urbana Nota Técnica
José de Sena Pereira Jr.

Na presente nota técnica analisamos a legislação federal referente à “poluição visual” em áreas urbanas e avaliamos até que ponto pode a União legislar nessa área. De início, reportemos ao art. 24 da Constituição Federal:

“Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
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VI – florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção ao meio ambiente e controle da poluição;”
VII – proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico;”
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§ 1º No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais”
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O artigo 30 da Constituição Federal relaciona as competências atribuídas aos Municípios, entre as quais estão asde legislar sobre assunto de interesse local, prestar serviços públicos de interesse local e promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano.

“Art. 30. Compete aos Municípios:
I – legislar sobre assuntos de interesse local;”
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V – organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial;”
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VIII – promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano;”
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Como parte essencial da faculdade da União de legislar sobre o tema em pauta está a definição do que é poluição, definição esta expressa pelo inciso III do art. 3º da Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981:

“Art. 3º Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:
.........................................................................................”
“III - poluição, a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente:
a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população;
b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas;
c) afetem desfavoravelmente a biota;
d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente;
e) lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos;”
..............................................................................................”
Cabe destacar que a Lei nº 6.938/81, que “dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências”, tem sido acatada como regulamento da Constituição Federal no campo do meio ambiente, detalhando a distribuição de competências entre os entes da Federação.
Temos, então, de verificar se a proliferação indiscriminada de “outdoors”, cartazes, luminosos e outras formas de propaganda, a qual chamamos genericamente de “poluição visual” enquadra-se nas definições de poluição expressa pela Lei 6.938/81, ou se se trata apenas de uma forma de utilização do solo e do meio urbano. Nesse aspecto, observamos que essa proliferação:
  • não prejudica a saúde, a segurança e o bem-estar da população;
  • não cria condições adversas às atividades sociais e econômicas, ao contrário, podem constituir atividades econômicas;
  • não afeta desfavoravelmente a biota, ou seja, não prejudicam a flora e a fauna;
  • não afeta as condições sanitárias do meio ambiente;
  • não lança matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos.
Restam dúvidas apenas quanto aos prejuízos estéticos que podem ser causados ao meio ambiente. Mas esta é uma questão subjetiva e dependente de padrões culturais e dificilmente poderá ser plenamente definida em norma legal.
Como não conseguimos enquadrar a “poluição visual” no conceito clássico e tecnicamente aceito de poluição, verifiquemos se as atividades que a geram referem-se à utilização do solo urbano. Como vimos, a “poluição visual” é formada, basicamente, pela colocação de cartazes ou “outdoors” e por anúncios luminosos ao longo das vias urbanas e nas fachadas dos edifícios. Pode-se considerar também como “poluição visual” as ocupações irregulares de terrenos públicos, geralmente situadas em margens de avenidas e em encostas não adequadas à urbanização. Todas essas causas de degradação da paisagem urbana ligam-se a alguma forma de ocupação do solo urbano.
Já mostramos que o inciso VIII do art. 30 da Constituição Federal incumbe ao Município “promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano”. A “poluição visual” das áreas urbanas ocorre, portanto, ou com o consentimento poder público municipal, ou pela ineficiência ou negligência dele.
O disciplinamento do uso do solo urbano é estabelecido por meio das leis municipais de ordenamento urbano e pelos códigos municipais de obras e de posturas. Se, em determinado Município, essas leis permitem atos que, para alguns, levam à “poluição visual”, nada pode ser feito em termos de legislação federal ou estadual, pois o “Pacto Federativo” garante a autonomia administrativa dos entes federados, respeitando-se as competências constitucionais de cada um deles.
O mesmo pode-se dizer dos Municípios que, por omissão, não dispõem de leis que regulam a ocupação do solo urbano, especificamente quanto a aspectos que podem caracterizar-se como “poluição visual”. Como esses aspectos não configuram razões para intervenção federal na administração municipal, nada pode ser feito, pela União, para coibi-los.
Outro argumento para que o poder legiferante sobre esse tipo de ocupação do solo caiba exclusivamente ao Município é a capacidade ou poder de fazer cumprir efetivamente uma lei que a discipline. Só o Município tem condições operacionais de fiscalizar a ocupação do solo urbano, bastando, para compreender essa afirmativa, imaginar o custo e a complexidade de uma fiscalização federal atuar, nesse campo, nos quase seis mil Municípios brasileiros. Como um nível de poder não pode impor, mediante lei, tarefas, competências e custos a outro nível, a competência de legislar sobre esse tema é, naturalmente, do Município. A possibilidade de efetivo exercício do poder de polícia determina, assim, a competência para legislar.
Concluindo, parece-nos claro que compete exclusivamente ao Município legislar sobre a colocação de placas, “outdoors”, letreiros luminosos e sobre a ocupação do solo urbano em geral, não podendo, a União, legislar sobre esses temas além das normas gerais por ela já implementadas, as quais tratam da proteção ao meio ambiente de uma forma ampla.

(JOSÉ DE SENA PEREIRA JR. Consultor Legislativo da Área XI Meio Ambiente e Direito Ambiental, Organização Territorial, Desenvolvimento Urbano e Regional
JANEIRO/2002
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